Enquanto retornava de uma agenda, me peguei refletindo sobre algo que vivi há mais de 20 anos. Na época, havia acabado de voltar do hospital, num domingo frio e chuvoso — 23 de junho de 2002.
Minha mãe estava internada há seis dias, e naquele domingo, minha irmã me levaria para visitá-la. Acordamos cedo, nos arrumamos, e quando estávamos quase saindo, o telefone tocou.
Fui até a sala e atendi. Do outro lado da linha, alguém do hospital se identificou e pediu alguns documentos dela. Informei que já estávamos a caminho e que levaria pessoalmente.
Bom… acho que você já sabe o que aconteceu.
Eu tinha apenas 15 anos (e vale lembrar que os 15 anos de 2002 não são os mesmos de hoje).
Na volta pra casa, entre parentes e amigos, vim de carona com um amigo da minha mãe. Ele me deixou aqui na porta de casa, mas eu não quis entrar. Fiquei no portão, sem coragem.
Eu estava só. E me sentia só.
Não compreendia, de fato, por que tudo aquilo estava acontecendo.
Ficava observando as pessoas passando na rua. Algumas me cumprimentavam, outras não. Mas ninguém, com toda certeza, sabia a dor real que eu estava vivendo naquele momento.
Fiquei ali, parada, até que minha “mãe do coração” apareceu — e então, naquele instante, eu pude voltar a ser apenas uma criança… nos braços dela.
Mas este texto não é apenas sobre a dor que vivi.
É sobre a reflexão que alcancei.
Enquanto voltava da agenda, naquele dia, observava o motorista seguindo por diversos bairros e ruas. De repente, vi um ônibus lotado — e algo naquele cenário me levou de volta àquele dia triste.
Olhando para aquele ônibus, refleti como nunca saberemos, de fato, o que cada pessoa está vivendo ali dentro.
Algumas estão indo visitar alguém no hospital.
Outras estão voltando pra casa depois de receber a notícia de uma morte.
Algumas estão radiantes por terem conseguido uma promoção.
Outras estão devastadas por descobrirem uma traição.
Algumas felizes com a descoberta de uma gravidez.
Outras apavoradas pela possibilidade de não ter o que comer até o fim do mês.
São muitos sentimentos. Todos… acontecendo ao mesmo tempo.
A verdade é que nunca saberemos a dor do outro. Nunca estaremos no mesmo lugar.
Só nos resta a empatia — a escolha de sermos melhores a cada instante.
Porque, um dia, será a nossa vez de passar.
Já imaginou estar em um ônibus ao lado de alguém que acabou de perder um filho?
Outra pessoa, talvez, acabou de enterrar a esposa.
Uma acabou de ficar desempregada.
Outra acabou de descobrir um diagnóstico de câncer.
Se soubéssemos, no mínimo, relevaríamos o mau humor de um deles.
Teríamos mais cuidado com o que dizemos.
Seríamos mais gentis.
Mas, infelizmente, somos muitas vezes ferro e fogo.
E machucamos ainda mais quem já estava ferido — pessoas que só gritaram porque estava doendo.
Se você me perguntar o que deve fazer com isso… eu talvez não saiba.
Mas com certeza, há aqui uma grande reflexão.